quinta-feira, 6 de abril de 2006

Uma "prostituta canora" renasce no Maxime lisboeta



José Cid renasceu no sábado à noite, no Maxime, cabaré da Praça da Alegria em Lisboa. Manuel João Vieira, um dos sócios, tinha convidado Cid, "a mãe do rock português", como uma vez se auto-intitulou, para um concerto no sábado, mas a desvairada procura de bilhetes esgotou rapidamente a sessão e obrigou à convocação de um segundo concerto, que aconteceu ontem.

Uma enorme fila à porta do Maxime deixava antever o sucesso. O Maxime acolhia uma velha "prostituta canora" (como José Cid se anunciou à assistência) emocionada pela recepção eufórica.

Trintões, quarentões e por aí fora; actores e gente das artes; vários elementos das Produções Fictícias que comemoravam o seu aniversário ali perto, no cinemaTivoli; muitos jornalistas; músicos como Paulo Gonzo; o editor discográfico David Ferreira; a sobrinha Catarina Flores, entre muitos outros, vieram cantar com José Cid os velhos sucessos, desde A Lenda d'El Rei D. Sebastião (ainda dos tempos do Quarteto 1111, que fez furor nos anos 60), ao clássico da música "xaroposa" que é Vinte Anos, uma das primeiras memórias musicais de alguns dos presentes: "Vem/Viver a vida amor/que o tempo que passou/não volta não/sonhos/que o tempo apagou/mas para nós ficou/esta canção".

Daniel Oliveira, dirigente do Bloco de Esquerda, faz parte da assistência entusiasmada e, entrevistado por uma televisão, justifica a sua presença pelo papel de José Cid na música portuguesa.

José Cid afirma-se temeroso perante o que chama "um concerto sem rede". Mas não havia nada a temer, o público presente no Maxime estava conquistado há vinte ou trinta anos, e disposto - liberto de constrangimentos ou complexos "intelectuais" - a aplaudir, dançar, homenagear um dos mais populares cantores da rádio das respectivas infâncias/adolescências.

E foi assim que a assistência cantou com Cid, desde "Um grande, grande amor" - "Amor, amour, mein liebe, love of my life", que venceu um festival da canção nos anos 80 - até "Como o macaco gosta da banana eu gosto de ti", ou "Cai neve em Nova Iorque, faz sol no meu país" e ainda "Na cabana junto à praia".

José Cid esperava Mike Seargeant e Tozé Brito, seus velhos companheiros de parcerias musicais, para o acompanharem em algumas canções, mas os dois falharam. Cid ainda chamou uma e outra vez, mas nem Brito nem Seargeant, nem Rita Ribeiro também convocada, apareceram a horas no Maxime. A acompanhar Cid esteve Paula Varela Cid e uma cantora galega, sua amiga, para quem compôs algumas músicas.

De certa maneira, como em O dia em que o rei fez anos (um sucesso da rádio com que José Cid concorreu a um Festival da Canção ainda nos anos 70), houve no Maxime um perfume de "arraial e foguetes no ar", "e o vinho correu à farta/ e a fanfarra não parou de tocar".

Este "rei" de 63 anos, que há mais de trinta, num festival em Tóquio, venceu Elton John, que na noite de sábado se queixou da vida e de dificuldades profissionais, conseguiu arrastar um mar de gente eufórica a um velho cabaré da Praça da Alegria. Como o próprio escreveu um dia, num velho êxito no sábado também muito aplaudido, talvez o fenómeno José Cid seja afinal coisa para "Ontem, hoje e amanhã".

Este texto foi retirado do jornal Diário de Notícias de Segunda Feira, 03 de Abril de 2006