terça-feira, 4 de abril de 2006

Momentos felizes com o teu temperamento quase humano



Este carro deu o peido, coisa que nos deixa a todos sentidos, tristes, com um sentimento de pesar. Neste Domingo, pelas quinze horas, na casa do Zé Jorge decorrerá um pequeno cerimonial em honra e memória deste veículo. Familiares e amigos irão marcar presença. É verdade, o Zé Jorge também festeja o seu aniversário nesse mesmo local, mas julgo que isso passará ao lado de todos nós... Aqui fica o tributo ao carro que tantas emoções me causou (se bem que as maiores foram as de pânico)...

A noite está fria.
Mesmo para ti
Que vieste de França
Que agitas e abanas
Quando a carroçaria balança
A subida é íngreme
Vertical mesmo até!
O Jorge tem de puxar por ti
Senão vai a pé…

A sofagem estourou
O autorádio avariou
Um buraco no escape
O farol apagou
A lua está lá no alto
Lá vai ele prego a fundo
Quatro rodas a voar
Até ao fim do mundo

A porta não abre
Preciso sair de dentro
O vidro está fodido
Saio logo no momento
Este carro é teimoso
Mais parece um jumento

Circulas a toda a hora
Do Fojo até ao Sr. Machado
O problema é se sai uma roda fora
Mesmo assim vais para todo o lado
Amigo de metal em tons cinza
Com tracção frontal
Com ferrugem e sem tinta
Mesmo assim ao lado de todos os outros
Tens muita pinta

Nos agoras e nos tempos idos
Naquelas noites desenfreadas
Com os bancos rebatidos.
Facilmente embacias
Mantendo-nos escondidos
Chic, chic era o som que fazia
No banco de trás
Enquanto eu gemia
Chic, chic, tantas vezes ouvido
Portavas-te lindamente
Eras o meu quarto de hotel
Mostravas-me o caminho
O meu amigo fiel

Anda com o vento
Na estrada inter municipal
Anda lá ao C.P.T.
É lá que está o pessoal

Quase que tinhas asas
O vento soprava
Nas curvas quase despistavas
A tinta despegava
O chão fugia dos pés
E a bateria afogava
Estradas infinitas correste
No passado e no presente
Nos muros e passeios
Passavas de tangente
Muitos arranhões e socalcos
Era só meter gasolina
E colar os pedaços
As peças que se iam despegando
No teu temperamento quase humano
Nos horizontes longínquos
Eras um carro de verdade
Um leão na grelha da frente
E ao teu volante
Um verdadeiro campeão
Já tens o teu lugar nos anais da história
Pena dolorosa e sentida
É o que sinto por ti
Da nossa relação vivida
Sinto muito a tua maleita
A tua avaria, a tua sina
Escuto o teu roncar
Quanto te metia as velocidades
Os travões a chiar
E o teu maravilhoso assobiar
Que matava de inveja
Que tornava qualquer Ferrari vulgar

Momentos desses jamais viverei
Por isso mantenho a esperança
De um dia ainda te ver a andar
Estás triste, ali parado
A apanhar chuva e vento
Sinto muito, mas tenho de te trocar
Dar-te-ei alegria na tua velhice
Ficarás para sempre no meu coração
Peugeot é a tua marca
A garra de um vencedor
CX-16-20 é a tua matrícula
A tua alma tem ardor, calor
Estarás sempre comigo
Em tons de cinza, que é a tua cor
Cinza desbotado com o tempo
Enfim, chegou a tua hora
O teu último momento…